quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A imagologia


'Não existe outro amor do que aquele que se constrói, não há outra possibilidade de amor do que aquela que se manifesta em um amor, não há genialidade senão aquela que se expressa em obras de arte. (...). Um homem se compromete em sua vida, traça seu perfil, e fora dessa figura não há nada.' 
Jean-Paul Sartre




  
'É uma ilusão ingênua achar que nossa imagem é uma simples aparência, atrás da qual se esconderia a verdadeira substância do nosso eu, independente do olhar do mundo. Com um cinismo radical, os imagólogos provam que o contrário é verdadeiro: nosso eu é uma simples aparência, inatingível, indescritível, confusa, enquanto que a única realidade, fácil demais de apreender e de descrever, é nossa imagem nos olhos dos outros. E pior, você não tem o comando sobre isso. Você primeiro tenta pintá-la você mesmo, depois pelo menos conservar uma influência sobre ela, controlá-la, mas em vão: basta uma fórmula maldosa para transformá-la para sempre numa lamentável caricatura.'

Milan Kundera

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

É assim que se luta!




Início do século 19, uma negra africana de traços anatômicos curiosos é exibida num circo de horrores inglês, num puteiro francês e por fim numa escola médica - todos se espantam com sua bunda enorme e sua genitália exótica. 'Vénus Noire', protegido pelo distanciamento artístico e histórico, explora o orgulho do europeu civilizado e os artifícios que o ajudam a ajustar a realidade a si - ou, pra ser menos maniqueísta, lida com a avidez por informação, a curiosidade, e com a incorporação do novo às crenças já estabelecidas.
É pra causar repulsa o destino trágico da coitada. É pra se sair do cinema com remorsos pelos erros do passado. Mas não é assim que se consertam as coisas. O interesse pelo que é novo e diferente é legítimo e desejável. Os expectadores de então - o público do circo, os libertinos, os cientistas - não devem ser condenados por sua curiosidade. Condenação esta que parte certamente dos expectadores contemporâneos meus, das suas poltronas numa sala de cinema, que sem a proteção da voz artística escondem bem escondida sua crença na própria superioridade intelectual.
Um imperativo moral made out of thin air do tipo "ai, ai, ai, não fale mal do seu amiguinho" não convence a ninguém, e nem deve. A curiosidade é saudável, e o novo deve ser conceitualizado com base em evidências - e aqui está a maior crueldade reportada pelo filme: a coitada foi convencida a cumprir um papel selvagem ridiculamente artificial. Se seu 'sócio' africâner a tivesse permitido mostrar a própria arte, a plateia se renderia - como de fato ocorre por um instante - e a frenologia (hipótese científica da época que suportaria a ideia de inferioridade intelectual dos negros) do Dr Cuvier perderia força.
Contra a ideia da superioridade caucasiana: Machado de Assis, Lázaro Ramos, Barack Obama, Paris Hilton e Bombino, esse neguim aí embaixo:



Como disse uma amiga minha, this is how you fight!

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Olá mundo

Esse blog, como tantos outros, nasce de uma necessidade de expressão (aka desejo de influência) mal satisfeita. O conteúdo dificilmente atingirá nível de qualidade comparável ao de um escritor de verdade, mas talvez se eleve acima da mediocridade - e há de haver no universo internético uma quantia de submedíocres que encontrem nisto algum valor.
Os valores propagandeados se definirão on the fly, mas prevejo textos de linguagem eficiente, marcados por falsa modéstia em pele de autocrítica sarcástica. Adianto ainda que preza-se mais pela paz que pela verdade, pelo que ideias serão exploradas somente até que - sem pudor de reconhecê-las incompletas.
Haja um deus que abençoe esta empreitada.