terça-feira, 27 de dezembro de 2011

A janela


- Por que você se importa?
- Porque gosto de você. Sei lá, dá pena te ver assim, feito pássaro voando em círculos procurando a janela.
- Não se preocupe, vou encontrar a janela. Ela existe, eu sou ágil; é inevitável.
- O que exatamente é a janela? - pergunta didaticamente.
O outro de repente bate as asas rápido, chega a mudar um pouquinho de trajetória.
- Como ass?..! (suspiro de quem se reconhece dependente da linguagem) Ok, já conversamos sobre isso antes. Eu já te expliquei.
- Nunca entendi direito, pra ser sincero. Sei que tem a ver com ... e com ... , mas isso nunca fez sentido pra mim como parece fazer pra você.
- É mais ou menos por aí mesmo. Essas duas ideias se cruzam e conectam por debaixo da mesa, e fazem surgir como óbvio o úmido ósculo oculto que vez em quando experimentamos, todos nós.
- Não consigo enxergar embaixo da mesa.
- Justamente!
- Justamente o que?
- O oculto está obviamente embaixo da mesa.
- Oi?
- Isso, o oculto é óbvio embaixo da mesa.
- ?
- Embaixo da mesa. Pode olhar.
- Eu não.
- Por que?
- Pra que?
- Porque.. porq..
Suspiro. Para de voar em círculos e pousa num canto do teto, sobre o trilho da cortina.
- Tem razão, é feio olhar embaixo da mesa.
- Quer mais uma cerveja?
- Não, valeu.
- Não consegue voar bêbado?
- Não.
- Você bêbado só voa pra dentro.
Solta um riso saudável e vai buscar uma cerveja.
- Dentro só tenho é tripas. Voar pra dentro, que ideia besta... - pensa enquanto limpa com o bico o sovaco da asa esquerda.

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